28.1.08

O Sétimo Selo: Terça, 29 e Quarta, 30 de Janeiro



O SÉTIMO SELO
Det Sjunde Inseglet
Ingmar Bergman
Suécia, 1957

Terça-Feira, 29 de Janeiro: 10H50
Quarta-Feira, 30 de Janeiro: 15H15
Auditório da ESEQ
Entrada Livre (e a liberdade é bonita)

Det Sjunde Inseglet é certamente um dos três ou quatro mais célebres filmes de Ingmar Bergman, se não for mesmo o mais célebre. Sobretudo se medirmos a “celebridade” a partir de questões “iconográficas” (por assim dizer): esta figuração da morte, encarnada magistralmente por Bengt Ekerot, fixou-se no imaginário colectivo do século XX, citada e re-citada em dúzias de filmes (e muito para além de filmes). Tal como sucedeu, aliás, com aquela que é uma das imagens “essenciais” do filme, a poderosa alegoria do jogo de xadrez entre Max von Sydow e a morte, e para a qual Bergman, segundo contou, colheu inspiração numa pintura de finais do século XV, existente numa igreja perto de Estocolmo, que retratava precisamente um jogo de xadrez entre um homem e um esqueleto, símbolo da morte. De certa forma, na figura de Ekerot, Bergman revestiu de “carne” esse esqueleto e esse símbolo da morte e no mesmo passo criou a mais perene “encarnação” da morte de toda a história do cinema. Da “lenda” de Sjunde Inseglet essa figuração é indissociável: este é o “filme da morte”, o “filme do jogo de xadrez”.
Mas é também o filme do céu e do silêncio, o céu e o silêncio dos planos que abrem e fecham o filme em rima. “E quando ele abriu o sétimo selo, fez-se silêncio no céu durante meia-hora” é a citação do Apocalipse que acompanha esses planos (e “explica” o título do filme). Como qualquer filme de Bergman, Det Sjunde Inseglet desafiou e continua a desafiar todas as exegeses e todos os exegetas, mas neste caso a profusão de alusões e evocações de temas e figuras cristãs (coisa que, obviamente, não é única nem exclusiva no contexto da filmografia bergmaniana) torna o debate sobre Det Sjunde Inseglet um dos mais complexos na obra de Bergman. Que se passa verdadeiramente nesta estrutura circular que vai de céu a céu? Que se passa bem entendido para além da alegoria? Que olhar sobre a vida e sobre a morte, mas mais ainda sobre o “além-morte”, propõe o filme? Det Sjunde Inseglet é um filme que tende para o mais grave dos desesperos ou para a mais pacífica das resignações?
Ao longo dos anos, os comentadores têm encontrado respostas de todo o tipo. O próprio Bergman referiu que o filme o ajudou a ultrapassar a angústia perante a morte, falando dele como uma “superação”. Anos mais tarde, descreveu assim a sua posição: “Tinha medo daquele enorme vazio, mas a minha opinião pessoal é que quando morremos, morremos, e passamos de um estado de existência (“a state of something”) para um estado de absoluto nada (“a state of absolute nothingness”); e não acredito nem por um segundo que haja alguma coisa acima ou para além, ou como se queira dizer; e isso enche-me de segurança”. Não se pode deixar de associar a estas palavras de Bergman um dos mais terríficos diálogos de Det Sjunde Inseglet, quando von Sydow confessa a um monge (que é a “Morte”disfarçada) que “grita por Deus mas às vezes parece que não está lá ninguém”. A Morte responde que isso (não estar lá ninguém) é uma possibilidade, e von Sydow desabafa: “Se isso for verdade, então toda a vida é um horror sem sentido”. Mas no filme não há propriamente uma resposta a essa dúvida (e nem a Morte, que é apenas “a morte”, pode dizer alguma coisa sobre o que se passa depois dela): Det Sjunde Inseglet não é um filme sobre nenhuma espécie de “além”, mas, como nesse mesmo diálogo a personagem de von Sydow também indica, sobre a vida e sobre a condenação em vida à terrificante angústia sobre esse “além” ou seja, sobre a vida debaixo do “silêncio do céu”, esse céu que como dissemos baliza o princípio e o fim do filme.(...)
Mas talvez seja mais simples do que isso, e talvez seja a própria “simplicidade” da vivência dos saltimbancos a configurar uma resposta à possibilidade de uma existência “para cá” da morte assim se opondo ao “horror sem sentido” dos temores de von Sydow, expressão de uma vida incapaz de se desprender da morte. Não “o céu”, mas “a terra”: como se a mais bela (e mais “religiosa”) cena de Det Sjunde Inseglet fosse aquela em que todos partilham o leite e os morangos.

Luis Miguel Oliveira,
Cinemateca Portuguesa - Museu do Cinema

2 comentários:

Fred Rocha disse...

recém chegado da sessão matinal, congratulo.vos pela belíssima selecção, e agradeço a abertura do convite. Cinema open.source, ora aí está um céu sob o qual vale a pena caminhar.

Pergunta: A tranquilidade do cavaleiro perante os sues momentos finais não se deverá à inferência - feita após o diálogo com a condenada 'bruxa' - que se o Diabo não existe também Deus e a Eternidade são mera quimera Humana ?

Anónimo disse...

"Quando o Cordeiro abriu o sétimo selo, houve silêncio no céu cerca de meia hora.
Então vi os sete anjos que se acham em pé diante de Deus, e lhes foram dadas sete trombetas.

Veio outro anjo e ficou de pé junto ao altar, com um incensário de ouro, e foi-lhe dado muito incenso para oferecê-lo com as orações de todos os santos sobre o altar de ouro que se acha diante do trono;

e da mão do anjo subiu à presença de Deus o fumo do incenso, com as orações dos santos.

E o anjo tomou o incensário, encheu-o do fogo do altar e o atirou à terra. E houve trovões, vozes, relâmpagos e terremoto.

Então os sete anjos que tinham as sete trombetas prepararam-se para tocar."
(Apocalipse 8, 1-6)